A pedagogia por trás da experiência clínica simulada: uma percepção de estudantes de enfermagem

Sección: Originales

Cómo citar este artículo

Nunes de Oliveira S, do Prado ML, Silveira Kempfer S, Waterkemper R, Caravaca Morera JA, Bernardi MC. A pedagogia por trás da experiência clínica simulada: uma percepção de estudantes de enfermagem. Rev. iberoam. Educ. investi. Enferm. 2015; 5(3):56-63.

Autores

1 Saionara Nunes de Oliveira, 2 Marta Lenise do Prado, 3 Silvana Silveira Kempfer, 4 Roberta Waterkemper, 5 Jaime Alonso Caravaca Morera, 6 Mariely Carmelina Bernardi

1 Enfermeira. Mestre em Enfermagem. Professora substituta do Departamento de Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina-UFSC. Florianópolis, SC. Brasil.
2 Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Professora Titular UFSC.
3 Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Bolsista de Pós Doutorado pela CAPES. UFSC.
4 Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Professora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre– UFCSPA. Porto Alegre, RS– Brasil.
5 Enfermeiro. Doutorando do PEN/UFSC. Professor da Universidad de Costa Rica - UCR.
6 Enfermeira. Doutoranda do PEN/UFSC.

Contacto:

Email: saionaranunes@gmail.com

Titulo:

A pedagogia por trás da experiência clínica simulada: uma percepção de estudantes de enfermagem

Resumen

Objetivo: analizar la percepción de estudiantes de enfermería con relación a la vivencia de simulación clínica con participación de actores.
Métodos: estudio en la modalidad de investigación-acción desarrollada junto a la carrera de enfermería. Realizado en mayo de 2013 con la participación de tres estudiantes de grado de enfermería. Los datos fueron recolectados a través de entrevistas semiestructuradas, realizadas después de su participación en una práctica simulada, y organizados según la propuesta operativa para análisis cualitativos.
Resultados: surgido tres temáticas: simulación clínica con paciente simulado: una vivencia auténtica; simulación clínica con paciente simulado: el desarrollo del racionamiento crítico por la autoevaluación y la simulación clínica con paciente simulado promueve el aprendizaje experiencial.
Conclusión: la enseñanza con paciente simulado tiene un gran potencial para el desarrollo del pensamiento crítico reflexivo utilizado con una teoría pedagógica constructivista.

Palabras clave:

simulación ; simulación de paciente ; investigación educacional en enfermería ; enfermería ; enfermería

Title:

Learning through clinical experience simulation: perceptions in nursing students

Abstract:

Purpose: To assess nursing students' perceptions about clinical simulation experiences with actors.
Methods: An investigation-action study was carried out along nursing studies. The study was performed in May 2013; participants were three undergraduate nursing students. Data were collected through semi-structured interviews once students had participated in a simulated practice; data were analyzed by means of the operative proposal for qualitative analyses.
Results: Three items emerged: Clinical simulation with a simulated patient: a real vital experience; clinical simulation with a simulated patient: Development of critical thinking for self-assessment and clinical simulation with a simulated patient promote experiential learning.
Conclusion: Learning through simulated patients has a significant potential for thoughtful critical thinking development used in a constructive pedagogical theory.

Keywords:

Simulation; patient simulation; educational research in nursing; nursing; nursing

Portugues

Título:

Pedagogía con la experiencia clínica simulada: percepción de estudiantes de enfermería

Resumo:

Objetivo: analisar a percepção de estudantes de enfermagem quanto à vivência da Simulação Clínica com participação de atores.
Métodos: pesquisa-Ação desenvolvida em um Curso de Enfermagem. Realizada em maio de 2013 com a participação de três estudantes de graduação em enfermagem. Os dados foram coletados por meio de entrevistas semiestruturadas, realizadas após a participação em uma prática simulada, e organizados segundo a proposta operativa para análise de dados qualitativos.
Resultados: emergiram três temáticas: simulação clínica com paciente simulado: uma vivência autêntica, simulação clínica com paciente simulado: o desenvolvimento do raciocínio crítico pela autoavaliação e a simulação clínica com paciente simulado promove a aprendizagem experiencial.
Conclusão: o ensino com paciente simulado tem grande potencial para o desenvolvimento de pensamento crítico reflexivo quando utilizado sob uma teoria pedagógica construtivista.

Palavras-chave:

simulação; simulação de paciente; pesquisa educacional em enfermagem; enfermagem; enfermagem

Introdução

A simulação clínica é um método de ensino que vem ganhando destaque e adesão nos cursos na área da saúde, seja pela forma ativa que envolve os estudantes, contribuindo para uma aprendizagem mais crítica e reflexiva, seja por sua versatilidade na criação de contextos clínicos autênticos, poupando os pacientes reais da exposição desnecessária para uma prática de ensino, favorecendo sua segurança (1).
Ao envolver o estudante, a simulação Clínica divide-se em três momentos: preparação prévia, ação e reflexão. A preparação prévia está relacionada ao conteúdo teórico e procedimental e de conhecimento do simulador, que subsidiará a conduta clínica; a ação refere-se à realização do atendimento propriamente dito, enquanto que a reflexão contempla o momento, também denominado de debriefing, em que o professor direciona a discussão a fim de estimular nos estudantes a autoavaliação através de perguntas que provoquem o raciocínio crítico (2).
O cenário simulado para esta vivência é um ambiente que reproduz fielmente o contexto a ser trabalhado com o estudante, de maneira que, pode-se contar com simuladores de paciente humano, que são os manequins de baixa, média ou alta tecnologia; com pacientes simulados, que são pessoas treinadas para interpretar os pacientes ou com Simuladores Híbridos, que é uma junção dos dois recursos (2).
O uso de simuladores no ensino já é algo comum na enfermagem. No Brasil, possuir um laboratório devidamente equipado é um item obrigatório para o credenciamento da instituição que pretende oferecer o curso (3). No entanto, não basta ter um laboratório equipado se não há uma compreensão da simulação como um processo dinâmico que envolve a criação de uma oportunidade hipotética que incorpora uma representação autêntica da realidade, facilitando a participação ativa do estudante e integrando as complexidades do aprendizado prático e teórico com oportunidades para a repetição, feedback, avaliação e reflexão (4).
Neste sentido, a simulação deve estar guiada pela pedagogia e não pela tecnologia (5), visto que o uso de tecnologias avançadas no ensino por si só não garantem a melhoria da aprendizagem, pois se o princípio pedagógico permanecer tradicional, mesmo que mais atrativo, continuará detendo o controle do processo, servindo para a reprodução de saberes em detrimento da construção conceitual por meio da interpretação (6).
Para que a simulação clínica possa ser considerada como um método para promover a aprendizagem experiencial, precisa ser compreendida como “processo por onde o conhecimento é criado através da transformação da experiência” (7:38).
A aprendizagem experiencial valoriza como conhecimento útil para o desenvolvimento, aquele que pode ser confrontado, comparado, ampliado, revisado e refletido junto ao conhecimento teórico e não somente a vivência pela vivência. Cada indivíduo tem uma forma particular de aprender, influenciada por determinadas características que são baseadas em quatro estágios da aprendizagem comuns a todas as pessoas: experiência concreta (sentir); observação reflexiva (observar); conceituação abstrata (pensar) e experimentação ativa (fazer) (7).
Sabe-se que para o estudante adquirir proficiência em habilidades clínicas, como exame físico e comunicação, é importante que ele possa ter contato com pessoas, e de forma reiterada exercitar essas habilidades (1). Os pacientes reais seriam a melhor alternativa para esse exercício do ponto de vista da fidelidade, no entanto do ponto de vista ético e pedagógico não são indicados, pois a tensão psicológica associada a insegurança do estudante aprendiz pode levar a práticas não seguras (8). Além disso, para garantir a segurança aos pacientes, os professores, algumas vezes, acabam influenciando no cuidado, o que limita as possibilidades dos estudantes aprenderem com seus erros ou refletirem sobre as medidas que devem ser tomadas caso aconteçam.
Esta situação favorece a utilização do Paciente Simulado que pode ser um ator profissional, um paciente treinado ou qualquer outra pessoa que se disponha a interpretar (1,9). Configura-se como uma alternativa segura de ensino, pois qualquer conduta equivocada pode ser posteriormente discutida, dando a oportunidade para o estudante refletir sobre o assunto e repetir a cena até atingir a proficiência sem causar dano real. Além disso, não expõe o estudante a situações que ainda não está preparado para enfrentar, pois as cenas são criadas de acordo com o nível de formação discente, o que nem sempre pode ser previsto na prática real. O objetivo deste estudo foi analisar a percepção de estudantes de enfermagem quanto à vivência da Simulação Clínica com participação de atores.

Metodología

Trata-se de uma pesquisa-ação desenvolvida em uma disciplina do Curso de Graduação em Enfermagem de uma Universidade do Sul do Brasil, que aborda a Consulta de Enfermagem ao paciente Diabético. Foram simulados três casos clínicos: paciente jovem recém diagnosticado com diabetes tipo 1, paciente idoso com diabetes tipo 2 há 15 anos apresentando sinais de complicação, paciente jovem em uso de insulina apresentando situações de hipoglicemia.
Os 22 estudantes matriculados no primeiro semestre do ano de 2013 na disciplina foram convidados a participar. Os critérios de inclusão eram: estar devidamente matriculados, ter disponibilidade e interesse em participar das sessões simuladas no período noturno. Atenderam a estes critérios 5 estudantes, dos quais 3 compareceram no dia da simulação.
A disciplina é organizada com aulas teóricas e práticas. A simulação aconteceu em maio de 2013, após a discussão teórica sobre o tema: consulta e cuidados de enfermagem ao paciente com Diabetes, antes do início das atividades práticas no Hospital. Neste contexto, as entrevistas aconteceram em dois momentos: uma na semana seguinte a simulação, antes da inserção do estudante no campo de prática, e teve como questão norteadora: Como foi participar de uma simulação clínica com atores? E a outra após o termino das atividades práticas no hospital com a seguinte questão norteadora: Como a simulação interferiu no seu processo de aprendizagem? As entrevistas foram gravadas, transcritas e identificadas pelo nome fictício que cada participante escolheu para si, garantindo assim o anonimato.
A análise dos dados seguiu a proposta operativa de análise qualitativa em três fases: a pré-análise em que os dados foram analisados e descritos; a exploração do material, cujos dados descritos foram codificados e organizados em categorias representativas; e tratamento e interpretação (10).
O estudo faz parte do projeto de pesquisa aprovado pelo comitê de ética da universidade sob Parecer 270.849/2013. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Resultados e discussão

A prática pedagógica se estrutura a partir de elementos sociais, culturais, teóricos, e acompanha seu tempo histórico, construindo-se e reconstruindo-se em cada época e tempo. Atualmente, pensar pedagogicamente, em especial, no ensino da enfermagem, presume ações complexas que extrapolam o fazer conteudista, mas assume conotação integrativa entre os elementos que constituem a dinâmica do ensino-aprendizagem. A aprendizagem é um processo contínuo fundado na experiência. O conhecimento não se limita ao conteúdo que está nos livros, mas na relação que se estabelece entre este e a prática, assim como na reflexão que se faz sobre cada ação que permite aperfeiçoar o fazer (7).
Sendo assim, neste estudo, a partir das entrevistas realizadas emergiram três temáticas para a discussão: simulação clínica com paciente simulado: uma vivência autêntica; simulação clínica com paciente simulado: o desenvolvimento do raciocínio crítico pela autoavaliação; a simulação clínica com paciente simulado promove a aprendizagem experiencial.

Simulação clínica com paciente simulado: uma vivência autêntica

Neste estudo foi possível evidenciar que a simulação clínica provocou o protagonismo do estudante, permitiu que o mesmo vivenciasse a consulta de enfermagem ao paciente Diabético de maneira que a experiência fosse próxima do real. Por esta razão gerou sentimentos ambíguos como insegurança e medo, mas também, satisfação e alívio.
A simulação despertou nos estudantes, inicialmente, sentimentos como ansiedade e medo, semelhantes ao que ocorre no primeiro dia de contato com pacientes reais. No entanto, no decorrer da cena os estudantes se sentiram mais confortáveis e tranquilos, conforme descrito:

Ao mesmo tempo em que dá muito medo antes, ansiedade na hora, depois dá um alívio, uma superação, poxa, legal, eu consegui, eu superei (Elisa).

O principal medo do estudante era o de não saber o que dizer ao paciente ou de ficar constrangido por se sentir atuando, no entanto, o preparo e a concentração dos atores contribuíram para que este medo diminuísse como descreve Maria Catarina:

A princípio eu achei que ia ser difícil, que eu ia dar risada porque eu me sinto simulando também, no caso, como se eu tivesse fazendo um papel de ator. Mas quando eu chamei, ela veio interpretando mesmo e quase chorou, então foi bem tranquilo, ela transmitiu aquilo que eu acredito que o paciente ia transmitir pra mim e eu consegui passar pra ela de uma forma natural, me sentindo mesmo enfermeira, acadêmica de enfermagem (Maria Catarina).

Os sentimentos descritos pelos estudantes se aproximam dos achados em outro estudo (11) em que, o primeiro contato de estudantes de enfermagem com contextos clínicos geravam sentimentos de medo e ansiedade. O estudante ao entrar em contato com o ‘novo’ tende a apresentar medo, mas é justamente esse ‘novo’ que transforma o momento de aprendizagem em algo inevitável e essencial, que é a experiência (12).
As alunas consideraram a simulação clínica como uma consulta real. O fato de saberem que se tratavam de atores no papel de pacientes não interferiu na maneira como vivenciaram a experiência, como menciona Alice:

Eu acho que isso acaba vindo da mesma forma, porque mesmo que você faça simulação, a gente faz pensando que poderia ser com alguém de verdade, então acho que o que eu sentiria com o paciente de verdade, eu senti um pouco, mesmo sendo atores (Alice).

A simulação permitiu que as alunas percebessem o quanto sabiam sobre o conteúdo, e como manifestam sua desenvoltura ao prestarem o cuidado:

Eu pensei que não ia conseguir fazer isso antes, daí vendo ali na hora, tu sabe mesmo, tu sabe como fazer, tu já tens o conhecimento prévio para isso, os professores já te passaram aquilo que tu precisas pra fazer isso... (Maria Catarina).

Portanto, vale destacar que, a aprendizagem é um processo contínuo fundado na experiência. O conhecimento não se limita ao conteúdo que está nos livros, mas na relação que se estabelece entre este e a prática, assim como na reflexão que se faz sobre cada ação que permite aperfeiçoar o fazer (7).

Simulação clínica com paciente simulado: o desenvolvimento do raciocínio crítico pela auto
avaliação

Discutir a própria atuação na consulta ao rever trechos do vídeo fez com que as alunas refletissem criticamente sobre suas condutas, bem como planejassem formas de melhorar, identificando assuntos que necessitam de maior aprofundamento teórico, como descrito:

Depois que a gente se vê, eu pensei até, eu podia ter perguntado isso aqui, eu podia ter olhado um pouquinho melhor o pé dele, eu podia ter pensado no calçado fechado que ele não estava usando [...] O mesmo processo de eu ver uma colega fazendo uma entrevista, “opa ela podia ter perguntado isso daqui [...]” Então, acho que foi o mesmo processo, eu vi o que eu errei, o que faltou, o que não faltou [...] o que foi legal, o que não foi (Elisa).

Acompanhar as colegas realizando a consulta simulada através da transmissão simultânea, também foi uma experiência de aprendizado e reflexão.

Eu observava coisas que eu também tinha feito, vendo outra pessoa fazer dá para perceber que foi errado ou que poderia ter sido de outro jeito. É, [...] ás vezes a forma de falar, o nervosismo mesmo, vendo outra pessoa fazer, a gente entende que a gente faz igual, mas deveria ser diferente [...] (Maria Catarina).

A simulação clínica favorece o desenvolvimento do raciocínio crítico, promovendo a autoavaliação. Essa autoavaliação que o discente faz sobre o que sabe e o que precisa saber, após uma simulação clínica é o início de um processo de avaliação formativa estimulado pelo método da simulação. A formação construtivista entende a avaliação formativa como aquela que acompanha e busca compreender de forma integral cada etapa da construção das habilidades desejadas deve envolver estudante e professor numa relação dialógica contínua (13).
Participar da simulação fez com que as alunas compreendessem a importância de uma educação significativa que contraria o modelo fragmentado ainda reproduzido em algumas instituições de ensino.

[...] a gente como estudante vê muita coisa desde a primeira fase, e a gente aprende, faz a prova e deixa. Na hora que a gente está ali, que está pensando, a gente começa a ter um raciocínio de tudo que a gente já viu, então eu acho que despertou esse raciocínio de “diabetes não é só isso”, diabetes envolve isso, envolve aquilo, envolve esse hábito, envolve aquele, sabe? Acho que mais o raciocínio lógico do que a gente já tinha visto... (Elisa).

A simulação permitiu que as participantes permanecessem refletindo sobre a vivência, analisando criticamente seu desempenho e, a partir dele, apontassem suas fragilidades, construindo alternativas para melhorar o cuidado prestado ao paciente com diabetes.

Depois eu pensei: [...] eu poderia ter pesado ela, poderia ter feito um exame físico pelo menos o simples ali, visto a pressão [...] e também para fazer um histórico, para fazer um registro dos dados, porque ela ia voltar depois de uma semana [...] e o que eu ia fazer naquela semana depois? Eu não ia ter tido o histórico de quando ela fez, de quando ela veio fazer essa primeira consulta, eu acho que faltou [...] Mas na hora eu não fiz por medo de fazer um exame físico [...] (Maria Catarina).

A satisfação sentida após participação de uma simulação clínica pode estar relacionada ao desvelamento do desconhecido. Os estudantes ao se familiarizarem com o contexto clínico proposto identificam suas fragilidades, mas também suas potencialidades, e ao reconhecerem que sabem, tendem a tranquilizar-se. No entanto, a simulação não é somente uma estratégia para aproximação de estudantes inexperientes aos cenários clínicos. Um estudo (14) realizado em Cingapura, com 10 profissionais de um curso de especialização, com anos de experiência clínica, média de 7 a 8 anos, também mostrou a efetividade do processo de aprendizagem por simulação. Os participantes atribuíram grande importância para o debriefing e para a fidelidade do cenário e consideraram que a simulação permitiu maior articulação entre teoria e prática.

A simulação clínica com paciente simulado promove a aprendizagem experiencial.

Após as alunas terem vivenciado a atividade prática da disciplina, com acompanhamento de pacientes com Diabetes em consultas reais, relataram que a experiência prévia de simulação auxiliou na compreensão da dinâmica das consultas, sentiram-se mais seguras e confiantes em relação aos demais colegas, que não participaram da simulação. Afirmaram que, mesmo não realizando efetivamente uma consulta ao longo das atividades teórico-práticas da disciplina, porque apenas observaram, tiveram um olhar diferenciado sobre cada caso e puderam inclusive auxiliar com as dúvidas dos colegas.

As meninas que não tinham acompanhado não sabiam ainda o que era a entrevista de enfermagem, a consulta de enfermagem, elas ficavam meio assim: ah, por que ela (enfermeira) perguntou isso e não perguntou aquilo? Daí eu falava: não, porque não é esse o objetivo da entrevista, já era um paciente que estava fazendo acompanhamento e tudo mais, não precisa dar todo o suporte do diabetes numa coisa que a pessoa já sabe, já tem conhecimento. Então eu acho bem interessante porque realmente fez diferença (Maria Catarina).

Neste sentido, a simulação se mostrou um método capaz de propiciar a aprendizagem experiencial, isto porque ao recriar um cenário, provoca no estudante a curiosidade epistemológica (15), que significa aproximar a experiência ao contexto teórico transformando-a.
Os ‘erros’ cometidos durante a simulação que foram posteriormente identificados pelos estudantes e discutidos em grupo, ressurgiram na segunda entrevista:

Acho que pude observar um pouquinho melhor os detalhes da consulta. A questão do pé, do chinelo, que aquele dia (simulação) o paciente que eu consultei foi de chinelo. Eu tive a oportunidade de pegar uma paciente que só usava chinelo, eu pude observar um pouquinho mais algumas coisas (Elisa).

Os atores conseguiram simular sentimentos comuns dos pacientes diagnosticados com doença crônica e despertaram a sensibilidade para este aspecto durante a consulta real.

Eu lembrei da questão do emocional do paciente. Teve uma paciente que tinha recém descoberto o Diabetes, também não entendia muito o que era a doença, ela começou a ficar desesperada, a fazer perguntas[...] eu lembrei da atriz que quase começou a chorar na minha frente e achei bem interessante (Maria Catarina).

As alunas acreditam que a incorporação do método da simulação com atores no currículo de enfermagem pode contribuir para uma aprendizagem mais efetiva de habilidades técnicas e comportamentais.

A gente acaba fazendo entrevista, fica fazendo histórico, então a gente tem que aprender a ouvir, tem que aprender a conversar, como lidar com esse paciente? Eu acho que fazer isso com o ser humano é muito diferente de fazer com um boneco, então por mais que seja algo técnico, eu acho que fazer com o boneco a gente até consegue aprender bastante, mas para aprender a ouvir e a falar tem que ser com o ser humano, não tem como ser com outro tipo de instrumento (Alice).

Ao propor um contexto autêntico, a simulação rompe com a educação fragmentada em que os conhecimentos separados em disciplinas perdem o sentido não instigando no estudante o desejo pelo aprender. Só aprende quem tem curiosidade e só tem curiosidade quem vê utilidade no assunto, neste sentido, é preciso que haja uma interligação entre as disciplinas para que o aprendizado seja significativo, para que se desenvolva o raciocínio crítico.

Participar de uma simulação clínica despertou nas alunas reflexões sobre o processo de ensino-aprendizagem, elas acreditam que vivenciar o atendimento ao paciente mesmo que simulado, faz com que diminua a dicotomia entre teoria e prática, facilitando a compreensão do cuidado.

E eu acho que a parte da aula é isso, é essa estrutura da consulta que a gente vê em sala, saber o que perguntar, saber o que relativamente olhar, e quando a gente chega na prática ali, daí já vai envolver tudo, vai ver como o paciente está se sentindo, ele vai dar expressões pra gente, expressões faciais, as vezes vai chorar daí a gente vai ter todo esse sentimento dele junto, eu acho que o teórico fica só nessa parte ali que não é tão palpável quanto essa (Maria Catarina).

A simulação clínica promove a aprendizagem experiencial em processo contínuo fundado na experiência (7). Neste processo, o aprender é um constante reaprender, pois, não sendo ‘páginas em branco’ cada indivíduo ancora o novo conhecimento a um saber prévio de forma a integrá-lo ou substituí-lo. A aprendizagem experiencial mediada pela simulação promove uma aprendizagem significativa, aquela em que o novo conhecimento se ancora em outros conceitos relevantes existentes na estrutura cognitiva (16). O estudante ao adentrar num contexto simulado faz uso dos conhecimentos teóricos trabalhados em sala de aula para elucidar problemas reais, põem em prática conhecimentos procedimentais, relacionais e emocionais. Ao estimular caminhos cerebrais que não se limitam aos ligados à memória, envolve-se efetivamente com o aprendizado, ressignificando e se apropriando deste saber (16,17).
 A simulação clínica é um importante passo na formação profissional; não substitui o contato direto ao paciente, embora facilite a aprendizagem através da experiência. O uso de atores na simulação clínica significa alta fidelidade psicológica que pode ser alcançada com poucos recursos tecnológicos (18).

Conclusão 

A percepção de estudantes de enfermagem quanto à vivência da Simulação Clínica com participação de atores, demonstrou que o ensino com Paciente Simulado tem grande potencial para o desenvolvimento de competências de pensamento crítico-reflexivo. Além disso, representou uma vivência autêntica que promoveu a reflexão, a interação e a aprendizagem, envolvendo aspectos objetivos relativos às orientações de enfermagem dispensadas aos pacientes, bem como a subjetividade que este momento de encontro proporcionou a todos, transformando a angústia inicial em satisfação.
O processo reflexivo da simulação promoveu nas estudantes o aprofundamento de seu próprio processo de conhecer e aprender, como possibilidade para seu crescimento pessoal e profissional. Ao reverem suas ações, refletiram sobre lacunas do conhecimento que ainda podem ser resgatadas.
Vivenciar uma ação de enfermagem em um ambiente simulado permitiu que as alunas refletissem sobre práticas e atitudes desenvolvidas diante do contexto real. A experiência promovida por este tipo de aprendizagem ampliou o olhar das alunas para o contexto e permitiu a partir da reflexão uma aprendizagem significativa, que não ocorre simplesmente pela presença no contexto, mas pela autorreflexão sobre este, significando-o.

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