CONTEXTO DA SALA DE AULA: ESTRATÉGIAS DE ENSINO E APRENDIZAGEM PARA UMA EDUCAÇÃO PARA CIDADANIA GLOBAL NA ENFERMAGEM

Sección: Originales

Cómo citar este artículo

Danielski K, Lenise do Prado ML, de Lima MM, Silveira Kempfer S, Selpa Heinzle MR, Pedroso Canever B. Contexto da sala de aula: estratégias de ensino e aprendizagem para uma educação para cidadania global na enfermagem. Rev. iberoam. Educ. investi. Enferm. 2019; 9(4):6-15.

Autores

1 Kellin Danielski, 2 Marta Lenise do Prado, 2 Margarete Maria de Lima, 2 Silvana Silveira Kempfer, 3 Marcia Regina Selpa Heinzle, 2 Bruna Pedroso Canever

1 Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Docente e coordenadora técnica-pedagógica na Escola
Técnica do SUS Blumenau Dr Luiz Eduardo Caminha, Blumenau, SC, Brasil.
2 Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Docente do Departamento de Enfermagem da
Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, SC, Brasil.
3 Pedagoga. Doutora em Educação. Docente do Departamento de Educação da Fundação
Universidade Regional de Blumenau. Blumenau, SC, Brasil.

Contacto:

Email: danielskikellin@gmail.com

Titulo:

CONTEXTO DA SALA DE AULA: ESTRATÉGIAS DE ENSINO E APRENDIZAGEM PARA UMA EDUCAÇÃO PARA CIDADANIA GLOBAL NA ENFERMAGEM

Resumen

La educación para la ciudadanía global, orientada por la UNESCO, surgió como una estrategia para promover una cultura global de paz, justicia, solidaridad, tolerancia, seguridad y sustentabilidad, adoptando estrategias activas y significativas de enseñanza y aprendizaje que promuevan habilidades ciudadanas y reflexión/acción a través de una pedagogía transformadora.  
Objetivo: el presente estudio tuvo como objetivo caracterizar el contexto en sala de clases e identificar las estrategias de enseñanza y aprendizaje/conocimientos para una educación ciudadana, utilizadas en la carrera de Enfermería.
Método: se trata de una investigación cualitativa, tipo estudio de caso. Se recolectaron los datos por medio de entrevista y encuestas. Participaron del estudio docentes y alumnos de la carrera. El análisis de los datos se realizó en función de lo preconizado por Stake para estudios de caso. A partir del corpus se creó la categoría: Desde la sala de clase tradicional a espacios dialógicos; y las subcategorías: Organización pedagógica de la sala de clases tradicional a espacios dialógicos, y estrategias participativas y conocimientos de enseñanza-aprendizaje, para una educación para la ciudadanía global.
Resultados: los resultados indicaron que lo referencial crítico, creativo y reflexivo ha de ser concebido por los docentes para conformar una educación para la ciudadanía global. Además, muestra al proceso de reflexión, como una acción mental que necesita de la voluntad del docente y del alumno para configurar un aprendizaje significativo.
Conclusiones: las estrategias de enseñanza y aprendizaje auxilian este proceso y pueden cumplirse por medio de la problematización y de una pedagogía transformadora.

Palabras clave:

educación ; educación superior ; enfermería ; pedagogía ; Aprendizaje Basado en Problemas

Title:

Classroom context: educational and learning strategies for global citizenship education in nursing

Abstract:

Global citizenship education, as guided by UNESCO, emerged as a strategy to promote a global culture of peace, justice, solidarity, tolerance, security, and sustainability; and adopted active and meaningful teaching and learning strategies that promote citizen skills and reflection/action through transformative pedagogy.
Purpose: this study aimed at characterizing the classroom context and identifying the teaching and learning/knowledge strategies for citizenship education, used in nursing schools.
Methods: this is a qualitative case-study investigation. Data were collected through interviews and surveys. Both teachers and undergraduate students participated in the study. Data analysis was performed according to Stake recommendations for case studies. Based on the corpus, a category was created: From the traditional classroom to dialog rooms; as well as the following subcategories: Pedagogical organization of the traditional classrooms to provide dialog rooms, and participatory strategies and teaching-learning knowledge, for a Global Citizenship Education.
Results: the results showed that a critical, creative, and reflective referential framework must be conceived by teachers to develop a global citizenship education. Moreover, the process of reflection, as a mental action that requires the will of the teacher and the student to configure a meaningful learning is shown.
Conclusions: teaching and learning strategies facilitate this process and can be accomplished through problematization and transformative pedagogy.

Keywords:

education; higher education; nursing; pedagogy; problem-based learning

Portugues

Título:

Contexto de sala de clases: estrategias de enseñanza y aprendizaje en educación para la ciudadanía global en enfermerí

Resumo:

A Educação para a Cidadania Global orientada pela UNESCO surgiu como estratégia para promover uma cultura global de paz, justiça, solidariedade, tolerância, segurança e sustentabilidade, adotando estratégias de ensino e aprendizagem ativas e significativas que promovam competências cidadãs e a reflexão/ação por meio de uma pedagogia transformadora.
Objetivo: teve como objetivo caracterizar o contexto de sala de aula e identificar as estratégias de ensino e aprendizagem/conhecimentos para uma educação cidadã utilizados no curso de Graduação em Enfermagem.
Metodo: trata-se de uma investigação qualitativa, tipo estudo de caso. Os dados foram obtidos por meio de entrevista e questionários. Participaram do estudo docentes e discentes do curso. A análise de dados foi realizada com base no preconizado por Stake para estudos de caso. A partir do corpus foi criada a categoria: Da sala de aula tradicional para espaços dialógicos e as subcategorias: Organização pedagógica de sala de aula tradicional para espaços dialógicos; e Estratégias de ensino-aprendizagem participativas e conhecimentos, para uma Educação para a Cidadania Global.
Resultados: os resultados apontaram que o referencial crítico, criativo e reflexivo precisa ser concebido pelos docentes para se conformar uma educação para cidadania global. Além disso, o processo de reflexão é uma operação mental que precisa da vontade do docente e do aluno para configurar uma aprendizagem significativa.
Conclusiones: as estratégias de ensino e aprendizagem auxiliam nesse processo e podem ser efetivadas por meio da problematização e de uma pedagogia transformadora.

Palavras-chave:

educação; educação superior; enfermagem; pedagogia; aprendizagem baseada em problemas

Introdução

Desde a década de 1990, a UNESCO tem como objetivo educar os cidadãos de todas as sociedades, especialmente em decorrência da Conferência Mundial de Educação para Todos, em Jomtien, na Tailândia, em que todos os países acordaram um compromisso e a meta de: erradicar o analfabetismo e universalizar o acesso à escola na infância. Desde então, a UNESCO se engajou na estratégia de empoderar os alunos, tornando-os cidadãos globais responsáveis, e, com isso, propôs uma Educação para a Cidadania Global (ECG), incluindo-a como meta para o período de 2014 a 2021 (1). A ECG pode ser concebida como uma educação que desenvolve conhecimentos, habilidades, valores e atitudes para um mundo mais justo, pacífico, tolerante, seguro e sustentável numa dimensão para além da educação, envolvendo aspectos sociais, políticos, culturais, econômicos e ambientais. Além disso, propõe habilidades cognitivas, nas quais se trabalhem atitudes de cooperação internacional para promover a transformação social.

Na perspectiva da ECG, as práticas de ensino e aprendizagem realizadas pelo docente precisam utilizar como recursos tecnologias globais como as Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC); usar métodos ativos de aprendizagem centrados no aluno, que o auxiliem a identificar-se em sua comunidade, país e globalmente; promover um contexto de aprendizagem interativo, inclusivo, respeitoso por meio do diálogo; incorporar atividades em cenários reais de aprendizagem; conceber uma avaliação que promova o desenvolvimento de competências cidadãs e uma aprendizagem significativa; oferecer oportunidades aos alunos para vivenciarem diversos contextos de aprendizagem locais e globais; ser o exemplo no que diz respeito às questões globais como a sustentabilidade, meio ambiente, ética e política (1).

Desenvolver práticas de ensino e aprendizagem que vão além da transmissão de conhecimentos teóricos implica uma educação que transcenda a concepção tradicional e ensine o aluno a pensar criticamente, refletir, ter atitudes profissionais e relações de convivência. Ou, de uma de várias outras formas, a educação por competências. Desde 2010, com o relatório Delors, o conceito de educação já estava associado ao desenvolvimento de competências para o mundo do trabalho, e para toda a vida. Pois, diante do mundo em transformação, a escola ganhou destaque na atuação inovadora para a necessidade constante de aprender a aprender (2).

Dessa forma, as modificações esperadas no mundo do trabalho fizeram com que o aprender a conviver juntos tivessem significado nas relações profissionais e pessoais, para que educandos pudessem compreender o mundo, a si e ao outro, passando a serem trabalhados no processo de ensino e aprendizagem valores como a compreensão mútua, solidariedade e harmonia. Além do aprender a conviver juntos, a educação constitui-se do aprender a conhecer, que representa o conhecimento a ser explorado e continuamente estudado além da educação profissional para a educação permanente, durante toda a vida (1).

Todavia, muitas são as dificuldades de implantação de um currículo de formação por competências, dentre as quais a manutenção de métodos de ensino conteudistas. Para se superar um modelo tradicional de educação e conceber uma pedagogia transformadora, torna-se necessário, além de vários fatores, a implantação de estratégias ativas que estimulem a participação, a reflexão, a crítica e transformação esperada no processo de ensino e aprendizagem (3).

Assim, o objetivo dessa pesquisa foi caracterizar o contexto de sala de aula e identificar as estratégias de ensino e aprendizagem/conhecimentos para uma educação cidadã, utilizadas no curso de Graduação em Enfermagem de uma IES privada com referencial crítico, criativo e reflexivo.

Método

Essa pesquisa, um estudo de caso segundo Stake (4), investigou um curso de Graduação Enfermagem, uma IES privada no sul do país. O projeto foi submetido ao Comitê de Ética para apreciação e aprovado sob CAAE: 63054416.1.0000.0121.

Participaram 13 (61,9%) docentes enfermeiros e 71 (36,97%) alunos de todos os semestres do curso de Enfermagem. Aos docentes foi entregue um questionário escrito e/ou enviado eletronicamente por e-mail. E aos alunos, foi enviado por e-mail link para preenchimento do questionário via GoogleForms. Por se tratar de um estudo de caso, buscou-se a participação de todos os estudantes do curso de Enfermagem, e por isso, todos foram convidados a participarem da pesquisa. Para os professores, os critérios de inclusão foram: ser enfermeiro e professor do curso de graduação em Enfermagem da IES investigada.

Os participantes apreciaram e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. A coleta de dados aconteceu entre os meses de abril a maio de 2017. Os instrumentos para a coleta de dados foram elaborados a partir das práticas de ensino e aprendizagem (uso de métodos ativos e interativos, uso de recursos globais, para uma alfabetização midiática, dentre outros) delineadas pela Unesco (1), contendo questões fechadas e perguntas abertas para complementar ou justificar uma resposta. Para os estudantes foi utilizado questionário eletrônico no Google Forms e para os docentes, questionário impresso. Os dados, foram organizados de forma a compor o corpus da pesquisa para posterior análise. A análise de dados foi realizada por meio de leituras exaustivas, interpretação e inferência sobre os dados destacando fragmentos significativos que foram agrupados por similaridade (dados qualitativos) e frequência (dados quantitativos), conforme recomendado por Stake (4) para estudos de caso. Nesse manuscrito, são apresentados os dados quantitativos sob a forma de frequência (absoluta e percentual) em gráficos e quadros.

Apresentação dos dados

Para esse estudo foi criada a categoria Da sala de aula tradicional para espaços dialógicos, e as seguintes subcategorias: organização pedagógica de sala de aula tradicional para espaços dialógicos; e estratégias de ensino e aprendizagem participativas e conhecimentos para uma Educação para Cidadania Global. A seguir, são apresentados dados tanto de docentes quanto de alunos participantes.

Constituíram dados da primeira subcategoria, respostas dos participantes acerca da organização das carteiras em sala de aula, dos 70 (100%) alunos, 57 (81,4%) assinalaram que são com as carteiras enfileiradas; 01 (1,4%) carteira em roda; 05 (7,1%) escreveram estágio na opção outros; 02 (2,9%) escreveram “sentamos em grupos de 03 mesas”; 01 (1,4%) assinalou carteiras enfileiradas e acrescentou grupos de 02 a 04 pessoas; 01 (1,4%) respondeu que senta em lugares diferentes; 01 (1,4%) que as carteiras ficam lado a lado; 01 (1,4%) que as carteiras ficam organizadas em trios; e 01 (1,4%) que há carteiras em duplas. De forma geral, segundo os estudantes, as carteiras ficam enfileiradas, lada a lado, ou agrupadas em grupos de 02 a 04 alunos.

Quando questionados, os professores corroboraram a afirmação dos estudantes, afirmando: 08 (61,5%) carteiras enfileiradas; 03 (23%) não lecionar em sala de aula, pois são professores de aulas práticas e essas acontecem em laboratório de Enfermagem ou espaços fora da IES. Apenas 03 professores (23%) fizeram considerações as suas respostas, a saber:

  • Quanto estou em sala de aula, embora seja eventualmente, procuro colocar os alunos em roda ou um de frente para o outro, ou um do lado do outro, ou da maneira que se sentirem melhor, o fato é que procuro não deixá-los enfileirados (D3).
  • As turmas possuem muitos alunos para podermos alterar a dinâmica (D6).
  • Depende do tema do dia, na maioria das vezes ficam em grupos (D8).

Docentes e alunos, em sua maioria, concordam que a organização da sala de aula está com as carteiras enfileiradas, até porque essa já é uma organização da IES. As salas são mantidas dessa forma, e quando o professor chega à sala de aula, dependendo da temática a ser trabalhada, organiza a turma em grupos, rodas, ou os deixa à vontade para se organizarem como preferirem.

Em relação aos conhecimentos trabalhados, os docentes correlacionaram os conhecimentos com os locais onde são mais frequentemente abordados. Os conhecimentos que mais foram apontados nos diversos espaços de aprendizagem estão descritos no Quadro 1. As Políticas Públicas apareceram como conhecimento trabalhado por todos os docentes respondentes, na sala de aula da IES (13) e em ambulatórios gerais (3) (Quadro 1).

Para os alunos, os conteúdos abordados pelo professor são: 61 (85,9%) apontaram os Procedimentos e Técnicas de Enfermagem; 49 (69%) mencionaram Políticas Públicas de Saúde; 62 (87,3%) citaram Conhecimentos Específicos de sua Área de Atuação; 47 (66,2%) referiram-se a Habilidades como Trabalho em Equipe; 14 (19,7%) apontaram Habilidades como Negociação e 31 (43,7%) Habilidades como Liderança; 30 (42,3%) fizeram menção a Habilidades como Tomada de Decisão em Conflitos; 55 (77,5%) aludiram à Ética e 02 (2,8%) ao Empreendedorismo; 05 (7%) mencionaram Questões Raciais e 06 (8,5%) Meio Ambiente; Acontecimentos Políticos foram citados por 05 (7%), enquanto que Cidadania foi apontada por 12 (16,9%); 02 (2,8%) referiram-se à Economia e 18 (25,4%) a Aspectos e Acontecimentos Históricos, sendo que 28 (39,4%) lembraram dos Direitos das Pessoas.

Tanto para alunos quanto para professores, independente do local de aprendizagem, os conhecimentos mais recorrentes foram: Políticas Públicas, Conhecimentos Específicos da Área de Atuação e Procedimentos e Técnicas de Enfermagem.

Num segundo momento, docentes assinalaram como trabalham os conhecimentos que sugerem uma educação para a cidadania global, e, que compuseram a subcategoria Estratégias de ensino e aprendizagem participativas e conhecimentos para uma Educação para Cidadania Global. Os participantes poderiam assinalar diversas estratégias de ensino e aprendizagem de forma que as que tiveram maior frequência estão descritas no Quadro 2.


Observa-se a predominância da Exposição Dialogada e Mediada pelo Professor e os Diálogos Sucessivos. Já para os alunos (n= 70/ 100%), as estratégias de ensino e aprendizagem que os professores mais utilizam são: 63 (90%) Atividades Práticas; 17 (24,3%) Debate e 33 (47,1%) Diálogos Sucessivos (Gráfico 1).


O propósito de investigar as estratégias de ensino e aprendizagem não foi quantitativo, de forma que, embora apresentados em frequências, os dados evidenciam uma diversidade de estratégias realizadas pelos professores.

Discussão

A categoria Da sala de aula tradicional para espaços dialógicos foi elaborada a partir da análise dos dados que trouxeram uma concepção em transição entre a tradicional e a problematizadora, apresentadas a seguir.

Numa concepção tradicional de educação, a sala de aula no ensino superior tem-se configurado em: “um espaço físico e um tempo determinado durante o qual o professor transmite conhecimentos (...), ora com exposições orais e lousa, ora com uso de slides ou transparências e (...) Power Point”. O professor se esmera em informar o que sabe, ao mesmo tempo em que o aluno escreve tudo o que escuta e copia o que lhe é mostrado nos slides. Nesse sentido, o espaço de sala de aula é um privilégio do professor, cabendo ao aluno a reprodução dos conhecimentos passados pelo professor (5,12).

Assim configurado se caracteriza o ensino como transmissão cultural (6), ou bancário (7) que se baseia na produção histórica de conhecimento que, acumulado, deve ser repassado às novas gerações, sob a forma de disciplinas. Também pode ser caracterizado como um ensino reduzido à prática docente e a aprendizagem reduzida ao rendimento acadêmico aferido por notas (6).

A concepção tradicional do ensino está baseada na narração do professor em sala de aula, que apresenta seus conhecimentos sob a forma de palavras expressas ininterruptamente, com o objetivo de “encher os educandos dos conteúdos de sua narração”, como se fossem copos a serem cheios, ou cérebros a serem alimentados de saberes. Por vezes os conteúdos narrados pelo professor são retalhos de conhecimentos fragmentados. Por isso, podem não ter significação para os alunos (7)

Segundo Souza et al. (8), na metodologia tradicional, o professor parte da ementa da disciplina, discorre sobre um tema (narração verbal), utilizando-se de um recurso expositivo, como estratégia de ensino e aprendizagem. Os alunos na sala de aula estarão organizados por filas, de costas uns para os outros, e se manterão quietos ouvindo atentos às palavras do professor, memorizando-as, e, não serão muito comunicativos, pois o professor tem certeza de que pouco eles sabem, e não são capazes de estabelecer algum diálogo. O professor se manterá à frente, de pé (numa relação hierarquicamente entendida como superior) e, irá proferir uma palestra transferindo as informações que achar pertinentes. Terá uma voz ativa e autoritária, impedindo qualquer interrupção. Como resultado do ensino, o aluno reproduzirá tal qual a fala do professor, na avaliação escrita.

A educação bancária tradicional “acarreta danos, alguns deles irreversíveis ao discente, que se torna um ser domesticado, adestrado, limitado e com dificuldades de se inserir no mundo” (8). Ela pode ser identificada quando docentes e alunos afirmaram que a exposição dialogada e mediada pelo professor foi a estratégia de ensino e aprendizagem predominante. Entretanto, há de refletir sobre a mediação do professor, pois nem sempre a exposição será narrativa, então, poder-se-á configurar num modelo híbrido entre a pedagógica bancária e a problematizadora.

Freire (7) afirma que professores na concepção tradicional são opressores e alunos são oprimidos, pois a educação bancária oprime, permite o depósito de conhecimentos de interesse para a domesticação da sociedade e a sua desumanização. A concepção problematizadora supera essa relação, empodera alunos para saírem da passividade no processo de ensino e aprendizagem, para se tornarem ativos, críticos, reflexivos e transformarem as práticas e a sociedade.

O principal indicador de mudança da concepção tradicional para a problematizadora é a presença do diálogo e da comunicação. O diálogo está presente no encontro do profissional com o outro para o ato de cuidar e o ensinar. Por meio do diálogo, na relação pedagógica o professor tem uma atitude e uma práxis diferenciada, na qual permite e estimula o pensar do aluno, sua reflexão e sua crítica. Num processo de reflexão na ação, o professor reflexivo se permite ser surpreendido pelo que o aluno faz. E, nesse modelo mediacional, o aluno é considerado um ativo processador de informações (6,7,10).

Silveira et al. (11) afirmam que o diálogo é o instrumento necessário para a problematização pois ele contribui para o exercício da crítica e criatividade na reflexão, promovendo num espaço democrático a inclusão social. Ao se permitir a reflexão da realidade, com seu desvelamento, se possibilitará a transformação individual e coletiva dos docentes e alunos e, o exercício de direitos individuais e de cidadão.

Para uma educação problematizadora, o espaço de sala de aula pode ser organizado em roda. Para Freire, a escola tinha uma conotação passiva, por isso, ao implantar um método para alfabetizar alunos de forma ativa, denominou de Círculo de Cultura, pois estava relacionada a como os alunos se dispunham no espaço de aprendizagem, em roda, um ao lado do outro, e, além disso, adotavam a postura de participantes e não de alunos, usavam o diálogo no grupo e não ficavam sob o discurso e a narração feita pelo professor (7).

Na primeira subcategoria: Organização pedagógica de sala de aula tradicional para espaços dialógicos os participantes deste estudo responderam que utilizam a sala de aula com as carteiras enfileiradas, pode-se inferir que um método tradicional esteja presente. Entretanto, ao organizá-los em grupos, o professor está proporcionando momentos de diálogo, para a reflexão coletiva, o compartilhamento de ideias e a produção do grupo. Trabalha a coletividade, o trabalho em equipe, a democracia e estimula a expressão dos alunos.

No método problematizador, o professor preparará sua aula, mas iniciará instigando as curiosidades dos alunos sobre o tema da aula. Esses estarão dispostos em carteiras em círculo, ou pequenos grupos, em posições que favoreçam o diálogo. O professor sentado, na mesma posição que os alunos, se utilizará de estratégias de ensino e aprendizagem participativas, ativas, que estimulem a manifestação discente, suas ideias, reflexões e, sobretudo, o diálogo. Serão comunicativos, questionadores e reflexivos. O aluno nesse processo é o ator principal e terá uma postura crítica, reflexiva; e, constantemente estimulado a pensar. E, dessa forma, empoderado, poderá propor mudanças ao relacionar a teoria com a prática, entre o ideal e o real. Terá uma postura transformadora e não mais reprodutivista das práticas docentes (8).

O método problematizador vai ao encontro da pedagogia transformadora constituinte de uma educação para a cidadania global. Essa se baseia numa aprendizagem que estimula a consciência sobre questões da vida, como o meio ambiente, a sustentabilidade, discriminação, ética, política, entre outros (temas que extrapolam o espaço de sala de aula) e propõe mudanças no ambiente social discente, por isso uma pedagogia transformadora. As mudanças podem ser individuais ou coletivas, em famílias ou comunidades (11). Para que isso aconteça, tornam-se necessárias práticas pedagógicas participativas e transformadoras, centradas no aluno, que estimulam o diálogo, reconhecem as diversas culturas, promovem o pensamento crítico e a criatividade, além de se empoderarem e desenvolverem a competência para a ação.
O desafio das IES é o de oferecer uma educação que desenvolva nos estudantes competências para atuarem no Sistema Único de Saúde, tornando-se assim profissionais críticos e reflexivos, “capazes de compreenderem as diferentes demandas dos usuários, famílias e comunidades, bem como de intervir nos determinantes sociais que interferem na qualidade de vida da população” (12). Dessa forma, a Graduação em Enfermagem precisa incorporar metodologias ativas que estimulem o raciocínio crítico, criativo e reflexivo dos estudantes.

Estudo de Souza et al. (13) considera que as metodologias ativas configuram-se numa formação diferenciada na área da saúde e sua implementação se dá pelas escolhas planejadas pelo professor que media o processo de ensino e aprendizagem. E, ao se utilizar de estratégias participativas, o professor acaba por criar um espaço de aprendizagem significativo e democrático e, consequentemente, tornando os alunos corresponsáveis por seu aprendizado, pois partem de seus saberes prévios, seus interesses e inquietações.

Na subcategoria Estratégias de ensino e aprendizagem participativas e conhecimentos para uma Educação para Cidadania Global, observou-se a predominância da Exposição Dialogada e Mediada pelo Professor e os Diálogos Sucessivos. Para os alunos, as estratégias de ensino e aprendizagem que os professores mais utilizam foram Atividades Práticas; Debate e Diálogos Sucessivos.

Da mesma forma, estudo de Wolhein et al. (14) apresenta como resultados que os alunos referem o método expositivo como mais utilizado pelos docentes, seguido de palestras, aulas práticas e demonstração de técnicas, sendo priorizada a abordagem tradicional. Ao mesmo tempo alunos (51,3%) também referiram que preferem as explicações do professor como método de ensino aprendizagem.

Dessa forma, quando o professor se utiliza de estratégias de ensino e aprendizagem ativas na Graduação em Enfermagem, o processo de reflexão e ação esperado precisa ser estimulado pelo professor, mas também precisa ter uma busca vinda do próprio aluno sendo protagonista do seu aprendizado (15).

Ao se utilizar estratégias de ensino e aprendizagem ativas na Enfermagem, aluno e professor, ao mesmo tempo, estão em interação e compartilhando saberes, num contínuo processo de reflexão crítica quando disponíveis para a troca de conhecimentos e experiências e, quando atuam com a equipe, constroem conhecimentos coletivos e desenvolvem a capacidade de escuta e diálogo ao se relacionarem com diversos profissionais da saúde (12).

O estudo de Lira et al. (16) considera que os professores da Graduação em Enfermagem precisam se utilizar de metodologias ativas de aprendizagem, não tradicionais e conservadoras, fragmentadas ou reducionistas. Ao ensinarem o exame físico de um paciente, por exemplo, que o façam para além da técnica e do saber fazer e consigam ensinar o contexto da prática profissional, e, com isso, fazer com que o aluno exercite a tomada de decisão. Uma vez que se envolve o contexto e permite-se a reflexão, o aprendizado toma significado, e há uma aprendizagem significativa, que servirá para toda a sua vida profissional.

Considerações finais

Essa pesquisa buscou identificar o contexto de sala de aula e identificar as estratégias de ensino e aprendizagem para uma educação cidadã, utilizadas no curso de Graduação em Enfermagem. Dentre as estratégias apontadas, a mais apontada está a exposição dialogada e mediada pelo professor. Isso demonstra que, superar um modelo tradicional de ensino ainda é um desafio para a Enfermagem, visto que muitos docentes foram formados sob a mesma concepção fragmentada e disciplinar de ensino.

Por isso, a promoção da reflexão contínua sobre a prática pedagógica pode contribuir para a implementação de novos modelos, com modelos híbridos curriculares e ação ativa e problematizadora, de cooperação, de interação com os alunos, configurando uma educação cidadã, por meio de uma pedagogia transformadora. Entretanto, para isso se tornar realidade é preciso ousadia e criatividade docente, para a utilização de metodologias ativas de aprendizagem e a diversificação dos espaços para uma aprendizagem significativa. Sugerem-se mais pesquisas sobre a temática como, por exemplo, como professores enfermeiros podem transformar sua prática para conformar uma educação para a cidadania global, e uma formação crítica, criativa e reflexiva que contribua para modificações na prática profissional de Enfermagem.

Bibliografía

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